domingo, 23 de abril de 2017

Vida -- Desastre exemplar

VIDA é um desastre exemplar, tipo de filme que deve ser visto para saber o que não é recomendável em uma produção. Praticamente nada se aproveita da obra, nem mesmo o bom elenco, subaproveitado.

Na trama, uma equipe de seis astronautas de uma Estação Espacial Internacional descobre sinais de vida em Marte, investigando com empolgação a descoberta. Porém, percebem que o ser encontrado é mais inteligente que imaginavam e muito mais hostil do que gostariam, quando já é tarde e o alienígena já está dentro da Estação. Ou seja, trata-se de uma cópia barata de "Alien - O 8º Passageiro" (com ênfase no termo "barata").

Para não cometer uma injustiça, a edição de som e o design de produção são bons, embora muito aquém do nível fascinante de um "Gravidade", por exemplo. Ainda assim, é prova de que nem tudo é ruim em "Vida". O problema é apenas todo o resto: roteiro, direção, montagem, atuações e assim por diante.

Previsível e frio, o roteiro é pavoroso, com um início equivocado, um desenvolvimento insosso e um desfecho extremamente previsível. O início é equivocado porque, como produção, o filme ignora um elemento de relevância ímpar no cinema, que é a identificação cinematográfica secundária. Ao invés de desenvolver as personagens e permitir que o público sinta afeto por elas, torcendo por elas, são personagens descartáveis, quaisquer, cujas mortes não são sentidas pelo espectador. E isso é um erro crasso! É essencial que o espectador se sinta envolvido pela trama e pelas personagens, que torça por elas, que queira que algo aconteça. Sentir-se indiferente pelo seu desfecho pessoal significa que o filme falhou em uma de suas tarefas principais. Exemplo disso é que dificilmente alguém sai da sala sabendo o nome do papel vivido por Ryan Reynolds, por exemplo. Quando o elenco é peão no tabuleiro, trabalhando apenas para a ação acontecer, é indício que, enquanto arte, o filme é um lixo.

É onde entra o desenvolvimento insosso. O sci-fi migra para um thriller que também não é envolvente graças à fraquíssima direção de Daniel Espinosa. No primeiro ato, o que se tem são cenas de ação de difícil compreensão, não se podendo compreender o que realmente acontece, de tão rápido e com tamanha pressa. Não é à toa que as cenas mais calmas são as melhores, como as que fazem testes com as amostras marcianas. Ora, se a ideia do primeiro ato era ambientação, tudo deveria ser mais lento. Mas não era, porque o segundo ato aposta em um entediante jogo de gato e rato. Roteiro ruim e direção ruim: protocolos existem, mas são ignorados - de que adiantaram os firewalls e as quarentenas afinal?; como um cientista capacitado é autorizado (por si mesmo e pela superior) a "brincar" com um ser ainda desconhecido como se fosse um animal de estimação?; como pode aquele ser ter tamanha inteligência e ser tão invulnerável? Aliás, a palavra que sintetiza a criatura é "exagero": cresce rápido demais e é inteligente demais. Sua aparência, porém, não impressiona nem causa asco. Na verdade, é um ser mais simpático que algumas personagens, que o roteiro nem permitiu conhecer. O que ele permitiu conhecer é o final, que é extremamente óbvio, idiota e previsibilíssimo.

Não é culpa de Jake Gyllenhaal que sabemos apenas que seu papel (seja lá qual for o nome) quer ficar no espaço eternamente. Nem de Rebecca Ferguson que... na verdade, nada pode ser dito dela, nem de Ariyon Bakare, nem de Olga Dihovichnaya ou Naoko Mori, pois seus arcos dramáticos pessoais são inexistentes. Sobre o papel de Hiroyuki Sanada o texto passa uma única informação, que é um manancial perto dos demais. E Ryan Reynolds aparece com o humor de canalha já costumeiro, que nem sempre funciona. Ou seja, "Vida" tem um elenco desperdiçado, pois quaisquer artistas poderiam desempenhar esses papéis nulos.

A a direção não é bem cercada. Há uma cena em que uma das personagens "brinca" com o alienígena, de maneira imprudente, com os braços dentro da unidade onde a criatura se encontra, mas, com apenas dois cortes, já está com os braços fora, claro problema de continuísmo. Além do continuísmo, a montagem também é mal feita, como na cena de maior tensão (a da mão presa, constante no trailer), exagerando nos cortes e reduzindo o impacto do momento.

Inegável, diante de tantos equívocos, concluir que VIDA é um desastre exemplar. É tudo que não merece ser feito na sétima arte, tudo de errado e que não deve ser feito jamais. Talvez engane alguns desavisados, que não estão acostumados com a técnica exemplar de "Gravidade" ou até mesmo "Perdido em Marte". Aliás, o "Planeta Vermelho" tem fascinado o cinema nos últimos tempos. Contudo, no caso de "Vida", teria sido melhor deixar o projeto na gaveta e o fascínio como um ideal.

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