sábado, 15 de abril de 2017

Despedida em Grande Estilo -- Mais hollywoodiano

"Eu, Daniel Blake" recebeu uma versão hollywoodiana. Vai-se embora o drama realista, entra a comédia suave; vão-se os nomes poucos conhecidos, entra o star system; esvai-se a acidez desconfortável, nasce o riso frouxo; adeus à reflexão constante, olá para o entretenimento efêmero. É essa a diferença entre o longa britânico mencionado e DESPEDIDA EM GRANDE ESTILO.

Como mencionado, o argumento é paralelo ao de "Eu, Daniel Blake" (embora este seja muito mais enfático e incisivo): a exploração dos idosos por parte dos bancos, resultando em problemas financeiros, o que eles consideram assaltos às suas aposentadorias e pensões. Joe (Michael Caine) testemunha um roubo a um banco, convocando seus amigos Willie (Morgan Freeman) e Albert (Alan Arkin) para que os três assaltem um banco juntos.

Assim, o roteiro tem como fio condutor temático o desrespeito aos idosos, do ponto de vista financeiro. Existe uma crítica social no fundo, mas com um viés bastante leve e divertido. É uma comédia mais divertida do que engraçada, de sorte que as piadas não costumam ser hilárias. Surpreende o fato que, apesar de serem idosos, esse fato não é rocambolesco na narrativa: em que pese mencionada incontáveis vezes, sua condição é perene no texto, enfatizando a "despedida". É também isso que faz a ponte com os arcos dramáticos pessoais e que permite a piada clichê de que pessoas de idade avançada têm dificuldade com tecnologia.

Michael Caine interpreta Joe, personagem principal, mais uma vez no piloto automático. Desta vez, a tarefa é encarnar uma figura paterna para a sua neta, um drama deveras superficial no plot. Alan Arkin, no geral, é o melhor do trio, atuando como um idoso rabugento que, meio que a contragosto, vive um affair com uma senhora fogosa (Ann-Margret, bem divertida). Com Arkin ficam as melhores piadas e o lado mais racional do trio. Morgan Freeman vive Willie, personagem que quase não tem arco dramático pessoal. Porém, Willie tem um problema pessoal que surge de forma oportunista na narrativa, como um plot point desconfortável). Especificamente em relação à atuação, Freeman segue o caminho de Caine, no piloto automático. Contudo, em uma única cena, os músculos da sua face se movem de maneira mínima, evidenciando o grande ator que ele é. Existem ainda algumas participações especiais sem grande relevo: Matt Dillon é o policial incompetente, enquanto Christopher Lloyd (sim, o "Doc") faz o alívio cômico (da comédia (!)) como um idoso já sem a sanidade. Kenan Thompson também está presente, em um papel digno da sua incompetência como ator.

A direção do filme coube ao inexperiente Zach Braff, que teve apenas três acertos que merecem menção. O primeiro se refere à excelente trilha sonora, com ápice em clássicos como "Hallelujah I Love Her So" e "What a Difference a Day Makes". A primeira foi cantada em um karaoke que pode ter feito Ray Charles se revirar no túmulo, mas receberá seu perdão porque fez sentido na cena (e a entrega dos artistas era sensível). A segunda é cantada em uma versão decepcionante. Também acertou a direção nas referências explícitas a clássicos da sétima arte, especificamente "ET o Extraterrestre" (a cena está no trailer) e "Um Dia de Cão" (para quem viu o filme, mais cômica ainda a referência). Ainda mais relevante é o acerto no clímax, referente ao roubo, que consegue ser eficaz ao mexer com as emoções - o assalto vai dar certo? Se sim, como? Vão ser pegos depois? Também interessante perceber que Braff elabora a tela dividida em uma sequência de conversa ao telefone, recurso usual em comédias, mas infelizmente em desuso. No mais, o material do roteiro não permitia um trabalho melhor.

Provavelmente os medalhões (três vencedores do Oscar!) que assinaram o contrato para filmar esse filme também não almejavam um "trabalho melhor". O escopo devia ser dinheiro e diversão. Algo menos europeu e mais hollywoodiano. Menos "Eu, Daniel Blake" e mais "Despedida em Grande Estilo". Cada um tem seu público, não é mesmo?

Um comentário:

  1. Apesar do que você diz mas, falar do Morgan Freeman significa falar de uma grande atuação garantida, ele se compromete com os seus personagens e sempre deixa uma grande sensação ao espectador. É de admirar o profissionalismo deste ator, trabalha muito para se entregar em cada atuação o melhor, sempre supera seus papeis anteriores, o demonstrou em Despedida em Grande Estilo , um filme que se converteu em um dos meus preferidos.

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